Por Carolina Frazon Terra e João Francisco Raposo (*)
“Broadcast” e “Socialcast” são conceitos que precedem o Brandcast. No primeiro, os veículos tradicionais de comunicação transmitem seus conteúdos às suas audiências, de uma maneira unilateral e massificada. Já no formato Socialcast, as figuras que se ocupam de disseminar conteúdos são os influenciadores digitais, e o fazem por meio das mídias sociais, aplicativos e plataformas da rede. Assim, o social se torna o principal o modelo de propagação e canal de informações, conteúdos e disseminação de influência usado por essas figuras.
Entendemos por Brandcast as difusões de conteúdo das marcas via mídias sociais ou próprias (sites, blogs, apps, etc), que vêm se aproximando muito dos modelos empregados pelos influenciadores digitais. São muitos os exemplos hoje que reforçam como as organizações podem exercer, também, o papel de influência no ambiente digital sem intermediários nem interferência de terceiros.
Hoje, com a hiperdigitalização, mesmo a mídia dita clássica (tv, rádio, jornais, revistas) passou a incorporar elementos da comunicação digital interativa para engajar e convocar a audiência a participar de seus produtos. Programas de sucesso mundial de grandes redes acolhem há algum tempo votações do público pelas plataformas digitais, como o The Voice e o Masterchef; telejornais recebem informações urgentes dos espectadores por meio de hashtags e mídias sociais; rádios e ouvintes colaboram mutuamente via WhatsApp; entre outros.
Neste contexto, o papel das organizações encontra espaço para ser uma plataforma aglutinadora de interesses comuns das pessoas baseando-se naquele setor/segmento em que atuam, servindo, inclusive, como fonte de confiança, referência e conteúdo de determinada temática. Assim, podem se apropriar de modelos consagrados usados no Socialcast, não dependendo exclusivamente destes, mas também, transformando seus canais próprios em publishers de conteúdo.
As Brandscasters criam pautas e fazem seus próprios veículos de mídia que vão “falar diretamente” com seus públicos, elaborando, discursivamente, conteúdo desintermediado no digital. Elas exercem o papel de municiar o público com informações e influenciar a formação de uma opinião favorável aos seus interesses institucionais e/ou comerciais.
A empresa brasileira de investimentos XP é uma delas, usando o modo como se comunica com fins de geração de boca a boca espontâneo e influência para a organização e seu público. Um dos propósitos da marca, de acordo com seus fundadores, é investir em comunicação para permitir mais acesso à informação sobre educação financeira, buscando se reinventar e abrir diálogos, falando e ouvindo a audiência em uma pluralidade de canais.
Em 2020, a empresa ampliou seu projeto Expert XP, antes exclusivo para o mercado financeiro, para que o grande público também pudesse participar. Criando debates virtuais por meio de dezenas de painéis que contaram com a presença de convidados internacionais e especialistas, a marca conseguiu atingir milhões de pessoas pelo digital e amplificar o acesso ao seu site, especialmente de não clientes interessados nos temas selecionados e disponibilizados pela organização.
Em 2018, Pyr Marcondes chamou o fenômeno de Communication Bypass, pautado pelo conceito (e estudo) semelhante do IAB (Interactive Advertising Bureau) de Direct Brands. Para ele, as marcas vão cada vez mais usufruir de seus próprios canais digitais diretos para se comunicar e criar relacionamento com seus consumidores, além de vender sem intermediadores.
As organizações, quando entendem que possuem conteúdo e espaço no segmento em que atuam, podem se tornar máquinas produtoras de informação relevante e influência para suas audiências digitais. Há quem nomeie esse tipo de postura da marca de Brand Publisher, reforçando a tendência de trazer cada vez o público por meio do conteúdo nos canais digitais, oportunizando mais relacionamentos e contato cada vez mais direto entre eles.
O blog do banco digital brasileiro Nubank, chamado de “Fala Nubank”, é mais um exemplo de como uma marca pode conquistar espaço informando e se engajando com sua audiência em um canal próprio, para além dos jardins murados das mídias sociais digitais. Mesclando conteúdo próprio e organizacional com temas de relevância para os consumidores, a organização consegue criar ali, por meio de suas postagens, uma comunidade de fiéis leitores que buscam mais conhecimento sobre seus serviços e as práticas do setor financeiro no Brasil.
Em posts recentes, a marca explicou, por exemplo, sobre a nova CPMF planejada pelo governo, a “necessidade” da nova nota de R$ 200, e porque a taxa da Selic não para de cair. Temas que normalmente seriam cobertos por veículos do jornalismo tradicional foram se tornando parte do trabalho de comunicação da organização para abastecer seu público e estender o relacionamento entre ambos por meio do Brandcast.
Se pararmos pra pensar, faz total sentido uma marca se tornar hoje uma produtora de conteúdo. As pessoas possuem expectativas em torno das organizações para que estas informem e resolvam oportunamente questões e problemas não solucionados por governos e instituições tradicionais. Isso ficou bastante claro durante a pandemia do novo coronavírus com o que chamamos anteriormente de social brands, e com os protestos #blacklivesmatter, no qual marcas como Nike, Netflix, HBO, Citigroup e Starbucks levantaram a bandeira para causas, escolhendo lados e também influenciando o debate do tema na sociedade por meio da informação.
Outra marca que se estabeleceu no Brasil como Brandcaster é a Magazine Luiza. Com uma estratégia de conteúdo parruda para além da simples venda, uma influenciadora artificial que é sucesso nas redes (a “Lu do Magalu” tem até perfil próprio e “cria” conteúdo nas principais plataformas de mídias sociais) e um olhar também para causas, a organização envolve seus seguidores, cria pautas próprias e gera buzz em função de seus posicionamentos e seus conteúdos. Recentemente a marca adquiriu o site Canaltech, uma plataforma multimídia de temáticas de tecnologia e notícias em formato diário, buscando ampliar ainda mais seu alcance, sua geração de conteúdo e sua audiência por meios próprios e sem intermediação.
Há cada vez mais oportunidades para que as organizações se posicionem em seus setores de atuação com voz ativa e legitimidade por meio de conteúdo original. Transportamos essa possibilidade para o ambiente digital em que as marcas têm a chance de se relacionarem com suas audiências de modo direto, expondo seus pontos de vista como fontes de referência e influência em seus segmentos.
Ser uma Brandcaster significa ter estrutura para atuar como uma publisher de conteúdo relevante; ser uma organização com posicionamentos claros sobre causas sociais e temais atuais; e, principalmente, compreender o caráter dialógico das redes com fôlego para influenciar e fazê-lo bem feito.
Sua marca está pronta para uma nova era de influência?
Texto originalmente publicado no site da ProXXIma
(*) Carolina Frazon Terra é pós-doutora em Comunicação pela ECA/USP, pesquisadora no grupo Com+ e professora na Faculdade Cásper Líbero, ESPM e ECA-USP. João Francisco Raposo é especialista em Comunicação Digital, doutorando e professor na ECA/USP, e pesquisador no grupo Com+.